sexta-feira, 25 de agosto de 2023

DIA 35 - Nunca "Está Pago" - conversinha boba sobre sexo e amor

 


Perdoem-me aqueles que pensam diferente de mim, mas eu não consigo pensar em sexo, ou no sexo, sem coligá-lo à dimensão do amor. Para mim em específico, o ato está ligado ao sentimento. Tenho consciência de que para outras pessoas, é possível fazer sexo sem amor, o que considero excêntrico e provável. Todavia, para mim, fazer sexo sem amor é como fazer uma atividade física, como outra qualquer e registrar no insta a terrível frase: “Tá pago”.

Daí, alguém poderia até me perguntar se eu já tentei fazer sexo sem amor? Ao que responderei prontamente que não tentei, nem tentarei, porque eu sei, de antemão, que me propondo a agir desta maneira, poderei me agredir contundentemente. É completamente sem sentido para mim uma relação sexual sem ligações diretas com a dinâmica do amor. Aliás, em minha perspectiva bastante pontual, o amor é a premissa fundamental de toda e qualquer relação.

Rita Lee e Roberto de Carvalho, inspirados em uma crônica do Arnaldo Jabor, escreveram uma música intitulada Amor e Sexo. Nas linhas melódicas da canção, sexo e amor se dissociam e se completam ao mesmo tempo. Entretanto, os compositores brincam com as evidentes diferenças entre uma dimensão e outra, com forte ênfase na ideia de que fazer sexo é mais apimentado do que sentir e viver o amor.

O amor para mim é o que move e o que movimenta toda a perspectiva da vida, dando a ela o contorno necessário para a garantia do bem-estar. Eu não me sinto um ser que se enriquece de qualquer maneira em qualquer situação em um determinado momento. Sinto-me sempre aberto a perspectiva da sexualidade se estou em uma relação de afetuosidade e intensa troca amorosa. Com isso, afirmo que jamais eu poderia ser colocado ou até mesmo rotulado na condição de um “pegador” contumaz, destes que colecionam suas ficadas. Às vezes, ouço algumas narrativas dos meus amigos mais próximos e alguns conhecidos, quanto às suas respectivas aventuras sexuais cotidianas. Dou risadas, até, mas não me vejo envolvido em nenhuma dessas histórias, qualquer que sejam elas.

Não sei por que cargas d'água eu gosto de seguir o meu coração e permitir, de alguma maneira, que ele seja tocado por outro coração que bata em sintonia com o meu, mas isso é bem efetivo para mim. Por esta razão, não me sinto muito aberto e propício a conquistas pontuais que se estabeleçam pelo acaso ou pelo ineditismo do momento, talvez pelo “Tinder”. Nada contra, entendam-me, por favor. É que nunca me vi assim, pois existe um lado meu extremamente romântico e apegado à poesia. O amor tem a sua conotação de sofrimento e isso me afeta positivamente. Eu não me cobro por viver dessa maneira. Ao contrário, respeito-me profundamente por entender que esse é o meu melhor jeito de captar a vida e de me equilibrar positivamente em minha dinâmica existencial. Eu entendo que existe uma relação muito próxima entre os sexos e os amores que se querem bem. Em minha humilde opinião, sexo e amor devem andar de mãos dadas, ampliando a arte do romance resultante daquela conversa atenta, marcada pela intensidade do mergulho dos olhos nos olhos.

Por isso, atrevo-me a dialogar com a saudosa Lee, com o Carvalho e o saudoso Jabor, especialmente com a sua crônica O amor atrapalha o sexo, publicada pelo jornal O Globo em 17 de dezembro de 2002, disponível no link: https://oglobo.globo.com/cultura/o-amor-atrapalha-sexo-25395132. Vale a pena a sua leitura.

Neste dialogo, eu, mais afeito ao meu lado poético, fico somente com as partes piegas do amor, dizendo que: Gosto do jardim, com cerca e projeto. Gosto de depender do desejo e construir o que crio. Não me masturbo. Sou agradecido após o ato sexual. Sou do depois, não do antes. Perco a cabeça ao mesmo tempo em que penso. Quero a redenção e o alcance da plenitude. Amo a impossibilidade no horizonte e até permito que o amor atrapalhe o sexo, sem necessidade de que gozem juntos. Quero a propriedade e a lei, mesmo que estejam presentes num sonho que deseja o um romântico latifúndio. Sou narcisista, ofereço e recebo o remédio e o veneno.

Continuamente, escrevo o meu texto sem exigir a presença do outro, mesmo o que é ausente. Quero a ilusão da masturbação que vem de dentro, de nós. Concordo com Rodrigues: "O amor, se não for eterno, não era amor". Invento a alma, a eternidade, a linguagem, a moral. Sou ridículo, patético,  egoísta e domador. Sou da prosa, sou mulher e quero a grandeza dos afetos. Que tudo vire amizade e que eu faça sexo sem camisinha. Sonho com a pureza e com o sonho dos solteiros. Posso até ser chamado de careta. No amor, morro me afastando da morte.

Aceito os paradoxos e as contradições do meu recorte, afirmando a minha posição continuamente, sempre ciente de que a discussão sobre a temática é muito ampla. Atualmente, num ambiente cultural e social totalmente tomado pela lógica da “sofrência” relacional e os seus decorrentes encontros e desencontros marcados pelo fortuito e pelo acaso, as relações se revelam puramente frugais, marcadas pela lógica do fazer por fazer, sem amor, sem apego. Mas eu quero o amor e o apego. Continuarei respeitando todos os que pensam ao contrário, seguindo o que acho que acontece em meu coração. Para mim, sexo e amor se complementam sempre. Bem sei que foi justamente isso que Jabor, Lee e Carvalho, dentre outros muito mais, disseram e corroboraram. Portanto, jamais direi que “Tá pago”.

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