quarta-feira, 30 de agosto de 2023

DIA 36 - Expectativas frustradas?

 


É inerente ao ser humano criar expectativas em relação à vida, principalmente em relação aos sonhos, às pessoas e aos relacionamentos. As expectativas podem ser de duas naturezas: As coligadas ao cotidiano, tipo “o que vamos fazer hoje?”, ou as que se encontram em uma programação futura – uma viagem, um curso, um projeto. Ambas estão diretamente ligadas à necessidade por satisfação dos desejos que, por sua vez, não podem ser satisfeitos completamente. Os desejos humanos são sempre buracos sem fundo. De uma maneira ou de outra, as expectativas que se manifestam em nossas vontades e em nossos desejos nos mantêm vivos.

Por outro lado, é inegável o paradoxo de que somos seres que criam e que frustram expectativas. Assim, desembocamos em um terreno inglório de boas e más resoluções relacionais. Isto ocorre por dois motivos específicos: o primeiro refere-se ao fato de que todos nós possuímos um anelo sistemático pela produção de heróis. Desejamos que as pessoas que convivem conosco se tornem heróis. O problema não reside em projetarmos heróis, mas em transformá-los em ídolos. Além desse anseio por heróis, nossa condição humana é contraditória. Por mais que alguma pessoa pretenda ser congruente, ela se constituirá como incongruente, pois não há espaços para a perfeição. Como nas palavras de Walt Whitman, em seu “Song of my self” – “Canção para meu ser”: “Eu me contradigo? Muito bem, então eu me contradigo. (Sou enorme, contenho multidões)”. O segundo refere-se à ideia de que achamos poder alcançar a felicidade. Todavia, felicidade plena não é possível de ser alcançada. Temos que nos contentar com as bolhas de sabão que fazemos e que nos alegram o coração naquele mágico instante de eternidade. É no momento que as belezas se revelam a cada um de nós.

Independente do ponto “a” ou ponto “b”, importa desafiar cada pessoa a olhar para dentro de si mesma, com a finalidade de acentuar um dos aspectos mais relevantes da existência, a saber, a humildade para contemplar o mavioso movimento do rio. Quando passamos a compreender que determinadas dimensões de nossa existência requerem paciência, damo-nos uma rica oportunidade de calma. De nada adianta se achegar à margem de um rio e tentar acelerar o seu fluxo com uma concha de feijão. Na melhor das hipóteses, só se estabelecerá o cansaço físico. Contemplar o caminho do rio pode nos ajudar a minimizar as ansiedades e valorizar o que de mais fundamental existe na nossa vida, ou seja, o contentamento de ser o que se é, como dá pra ser naquele momento presente.

Temos que estar descomprometidos com processos que nos convocam à perfeição ou à comparação. A grande gama de exposição de vidas felizes nas redes sociais ou mesmo as “poderosas” lições dadas pela miríade de coachs é um engodo que pode levar muita gente a se entender menor do que as outras pessoas. Uma coisa é cada um de nós buscar a nossa melhor versão de si mesmo. Outra, bem diferente, é aceitar a falácia da meritocracia, pois todos nós, seres humanos, somos sínteses de contradições. Por isso, o ideal é sempre manter a cabeça no lugar e se encher de humildade: a certeza de que somos pó, que somos da terra e a ela voltaremos. É olhar o húmus e se perceber simples e pequeno ante a grandiosidade do universo.

A manutenção de nossas expectativas num campo equilibrado e coerente com a vida pode evitar a frustração quando o objetivo não foi alcançado. A nossa saúde mental precisa de sobriedade e de humildade sempre, não para sermos bobocas, mas para nos entendermos melhor no nosso mundo de sentidos. Enfim, que as nossas expectativas quanto ao cotidiano e quanto ao futuro sejam coerentes. Precisamos de equilíbrio para alcançarmos os nossos intentos e contentos.

 

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