Gosto de viajar. Gosto mais ainda de observar
as belezas naturais que se revelam pelas janelas dos veículos diversos: ônibus,
trens, automóveis, navios ou aviões. Gosto, especialmente, do visual liberto
provocado pelas trilhas feitas com a minha bicicleta, mas invejo os aventureiros
que, mesmo levando uma vida marcada por altos e baixos, singram montanhas e
vales, abismos e cachoeiras conhecendo relevos, climas, naturezas, animais e
gentes diversas.
A ideia de um visual liberto tem a ver com a
entonação do olhar, melhor dizendo, com o desenvolvimento da contemplação em
todas as nuances do cotidiano. É fundamental que nosso olhar esteja fixado à
concretude dos corpos em ação no enfrentamento dos dilemas corriqueiros, sempre
ajudando-nos a vivenciar a maior expressão de nossa humanidade: a
espontaneidade para sermos e vivermos a nossa melhor versão, dentro dos limites
que nos forem propostos.
A poesia
natural e o meio ambiente
Em minhas viagens, encanto-me com a poesia
colorida, revelada e expressa pela natureza e pelos seus respectivos biomas.
Infelizmente, lugares lindíssimos estão sendo violentados pelos seres humanos,
detentores do poder econômico. É o caso da nossa floresta amazônica e do
pantanal. Sofremos quando visualizamos o meio ambiente ser atacado de diversas
maneiras. Choca-nos, por exemplo, quando nos chega às narinas o odor das
queimadas que destroem a vegetação, os animais, a água e a própria terra. Seres
humanos, de todos os lugares deste planeta, devem denunciar as referidas
afrontas e desenvolverem uma atitude mais cuidadora para com o meio ambiente.
De qualquer forma, independente destas distorções presenciadas por cada um de
nós, a natureza e o meio ambiente são nossas ambientações mais efetivas. O
planeta e sua natureza são os quintais das nossas casas.
A beleza
do ipê amarelo e suas lições para a vida
Preciso confessar que a poesia que mais me
encanta, entre todos os seres vivos nos mais distintos biomas, é o ipê amarelo,
uma árvore brasileira bastante conhecida e muito bela. Ela se encontra presente
em todas as regiões do Brasil e pertence ao grupo das Tabebuia alba.
As árvores desta espécie proporcionam um belo
espetáculo com sua esplêndida floração na arborização de ruas e matas. Elas
embelezam e promovem um colorido no final do inverno, anunciando a chegada da
primavera. Essa árvore é natural do semiárido alagoano e levou o governo deste
estado, por meio do Decreto nº 6239, a transformá-la em árvore símbolo. Em fins
de setembro, os ipês revelam suas belas cores, numa espécie de “epifania” – uma
aparição inusitada na terra dos viventes.
Curiosamente, é o estresse causado pelo frio e
pela seca que aciona o relógio biológico das árvores, indicando o
florescimento. É de uma experiência de “quase morte” que surge a beleza das
flores dos ipês anunciando sua beleza comovedora. Do frio e da seca surgem
flores exuberantes e seus tons que fazem os olhos sorrirem. As flores atraem
abelhas e pássaros, principalmente beija-flores. As sementes espalhadas pelos
pássaros são semeadas pelos ventos.
Da
contemplação à existência
O que mais me espanta é o fato de que estes
ipês, na maioria das vezes, se encontram solitários. Independente da forma e do
tamanho de sua copa, os ipês são seres lindíssimos que nos convidam à contínua contemplação.
Parecem convocar cada alma ao despertar das emoções e sentimentos mais
aprofundados. Talvez, por conta da minha leitura mais atenta à obra de Rubem
Alves, eu tenha me sentido mais tocado quanto à beleza dos ipês amarelos, suas
árvores preferidas. Ele via estas árvores como sacramentos. Em suas palavras:
“Penso que os ipês são uma metáfora do que poderíamos ser. Seria bom se
pudéssemos nos abrir para o amor no inverno. Corra o risco de ser considerado
louco: vá visitar ipês. E diga-lhes que eles tornam o seu mundo mais belo. Eles
nem o ouvirão e não responderão. Estão muito ocupados com o tempo de amar, que
é tão curto. Quem sabe acontecerá com você o que aconteceu com Moisés, e
sentirá que ali resplandece a glória divina”. (As Cores do Crepúsculo, 49). Cabe
salientar, encerrando momentaneamente a inspiração deste autor de Boa
Esperança, que o logotipo do Instituto Rubem Alves é um ipê amarelo. Amarelo era,
também, a cor preferida de Van Gogh, que pintou múltiplos girassóis, minhas
flores preferidas.