quinta-feira, 4 de maio de 2023

DIA 17 - Sem medo de dizer quem eu sou! Paris e a Psicoterapia!


No livro de John Powell, intitulado “Por que tenho medo de lhe dizer quem sou?” (Belo Horizonte, Crescer, 1989), nos deparamos com um desafio que se propõe a cada um de nós que tem a necessidade de viver a vida da maneira mais honesta possível, sendo ouvidos e compreendidos por uma escuta atenciosa. Embora nem todas as pessoas possuam a capacidade de acolher simpaticamente e empaticamente o que cada um revela em sua essência, os possíveis acolhimentos cotidianos são essenciais.

Especialmente, nos processos psicoterápicos que se desenvolvem nos settings terapêuticos, cada cliente ou paciente é estimulado a falar e viver com a mais extrema sinceridade, potencializando quem de fato é em seu cotidiano. Isso favorece a ampliação das relações. Nas palavras de Paul Tournier, que prefacia o livro de Powell: "Ninguém pode se desenvolver livremente nesse mundo, nem encontrar uma vida plena, sem sentir-se compreendido por uma pessoa, pelo menos...." (p. 5).

Ser ou se sentir acolhido na psicoterapia é fundamental, principalmente na sociedade atual que embaça a autenticidade inerente a cada ser. A tendência à robotização e à automação força cada sujeito a se aplicar sobre as suas respectivas máscaras, exercendo papéis teatrais que o afastam das suas mais pertinentes espontaneidades. A implicação disso é que, em algum lugar, dentro de cada ser, se esconde o sentido real do que se é de fato.

A busca pelo ser real pode se consolidar por intermédio do caminho psicoterápico. Para mim, em especial, a psicoterapia é o processo essencial que favorece a busca de sentido do ser humano em seus contextos vivenciais, tanto subjetivos como comunitários.

Hoje, na condição de um psicoterapeuta, eu vivencio experiências extremamente significativas no contexto da minha própria vida, mediante as minhas escutas atenciosas e provocações diversas. É muito especial perceber os meus clientes avançando em suas reflexões e em suas respectivas conquistas – procedimentos fundamentais que levam cada pessoa a ter uma melhor visão de si mesma. Eu acredito que este é um dos grandes fundamentos da psicoterapia: caminhar lado a lado com a pessoa, possibilitando a essa pessoa a descoberta de suas potencialidades e a oportunidade de se posicionar melhor em seu mundo de vivências.

Eu já estive do outro lado da psicoterapia, como uma pessoa que se disponibilizou a ser cuidada no setting terapêutico. Essa experiência me proporcionou aprofundadas visões do meu mundo de sentidos. Aliás, existem duas experiências que eu considero fundamentais em minha dinâmica de vida. A primeira delas se deu quando eu tive a oportunidade de estudar em Paris na França em 2013, permanecendo lá por seis meses. Considero essa primeira experiência um divisor de águas em minha vida. Tendo sido criado por uma família que não cessou esforços para cuidar de mim, esta foi a primeira vez em que eu tive uma responsabilidade plenificada sobre mim mesmo, preparando a minha comida, lavando a minha roupa, arrumando o meu quarto e fazendo todas as atividades corriqueiras, inerente a qualquer pessoa que mora sozinha. Ao mesmo tempo, pratiquei o meu direito de ir e vir sem ter que dar satisfação a qualquer pessoa na minha vida. Não que isso me incomode tanto, mas é uma experiência singular possuir a mínima liberdade para ir aonde se desejar, beber o quanto se quer e o que se quer, comer as besteiras mais exóticas sem necessariamente ter que prestar algum tipo de relatório a pessoas próximas. Viver como eu vivi na França me trouxe um frescor inenarrável.

A segunda experiência igualmente marcante em minha vida se deu no processo psicoterápico. Eu já havia voltado de Paris e já estava cursando a Psicologia. Em meio aos meus encontros e desencontros, principalmente os desencontros e as crises provocadas pela reflexão em torno da Psicologia, vivi na clínica psicoterápica a busca de um conhecimento mais aprofundado de mim mesmo. Procurei por psicólogos e por psicólogas, visando estabelecer o vínculo terapêutico. Quando me encontrei com essa vinculação, pois sou daqueles que se acreditam na vinculação terapêutica, eu me joguei completamente ao processo psicoterápico. Para mim, a vinculação terapêutica corresponde a 80% do processo. Obviamente, para que ela aconteça, faz-se necessária uma boa simbiose, ampla sintonia, empatia e simpatia entre o psicoterapeuta e o seu cliente.

A minha psicóloga é psicanalista. Conduziu-me de forma firme, fortalecendo a transferência e possibilitando o meu encontro comigo mesmo de uma forma intensa e profunda. Eu tive múltiplos insights em seu consultório. Passei por experiências marcantes e me desconectei dos meus medos, anseios e culpas. A psicoterapia para mim foi libertadora. Ajudou-me a me perder o medo de dizer que eu realmente sou. E quanto às pessoas que me cobram determinadas posturas ou composturas, acho melhor elas tomarem cuidado, pois, para mim que perdi o medo, a língua afiada por ser ferina também. Se insistirem em fofocar, eu lhes responderei: “Está tudo bem, mas, me chamem para fofocar, também. Posso contar a vocês coisas horríveis sobre mim”. E como diria uma amiga minha: “Beijinhos de luz para vocês”!  

DIA 71 - Olho e língua da minha amiga - Em memória de Iracy Costa Rampinelli

  Quando eu era criança, sempre me convidavam para as festas de aniversários. Eu, que nunca tive festas de aniversário, ficava deslumbrado c...