sexta-feira, 12 de janeiro de 2024

DIA 58 - Repensando o consumo, dizendo não ao consumismo...

 


Há algum tempo eu tenho refletido sobre as questões inerentes ao consumo e ao consumismo presentes em nossa dinâmica de vida social. De fato, as mídias em geral se esmeram continuamente na tarefa e elaboração de bons reclames, cujos intuitos são o de despertar, ainda mais, o desejo das pessoas para comprar objetos desnecessários ou supérfluos.

De antemão, é fundamental entendermos que o consumo tem a ver com a satisfação de nossas mais básicas necessidades, Como tal, em uma sociedade capitalista, é entendido e aceito de uma maneira convencional. Por outro lado, o consumismo é uma prática alienada cujas ações desenfreadas fazem com que uma pessoa adquira um determinado bem ou produto sem a mínima necessidade. Segundo o site Educa Mais Brasil, “O consumismo é um fenômeno social estimulado pela sociedade capitalista devido à sua capacidade de movimentar a estrutura econômica e, desse modo, garantir o funcionamento das engrenagens de consumo. Contudo, ele também constitui um aspecto característico de subjetividades fragilizadas. E, muitas vezes, está associado a transtornos de saúde mental, como ansiedade e depressão. Conceitualmente, o consumismo pode ser definido pela compulsividade em comprar. Desse modo, é considerado consumista o indivíduo que adquire com frequência produtos para os quais não possui necessidade. Esse fenômeno emerge com a sociedade do consumo que é estruturada no período pós Revolução Industrial e é retroalimentado pelas estratégias empregadas pelo capitalismo”. Curiosamente, o consumismo já ganhou uma classificação como doença pela OMS. Trata-se da oneomania, a doença do consumo desenfreado. Segundo dados da própria organização, cerca de 8% da população mundial sofre com este transtorno. Seus principais sintomas são: pensar em compras o tempo todo, sentindo angústia a respeito; estourar o orçamento frequentemente e gastar mais do que ganha, principalmente com itens desnecessários; gastar demais a ponto de prejudicar relacionamentos e carreira; esconder compras de pessoas próximas e mentir sobre os valores gastos; viver endividado sem a menor perspectiva de sair do vermelho; repetir continuamente o ciclo “gatilho-descontrole-ressaca-recaída”.

Uma simples olhadela no interior de nossas casas nos fará enxergar o número excessivo de quinquilharias que estão em nosso entorno, mas não servem para absolutamente coisa alguma. O fato é que em todos os dias, somos bombardeados com uma série de cores, sons e formas imagéticas, cuja finalidade é a de fazer com que cada um se sinta menos gente por não possuir aquilo que foi midiatizado. Um minuto de cada propaganda sobre determinado produto diz que nós não somos porque não temos, não possuímos.

É antiga essa discussão quanto ao ser e ao ter. Ela é complexa e envolve cada pessoa em sua respectiva zona de sentido, convocando-a a observar um novo estilo de vida ou uma nova orientação existencial. Sobre este assunto, o psicanalista Erich Fromm expressou: “Por ser ou ter não me refiro a certas qualidades distintas de um sujeito em declarações como: ‘eu tenho um carro’, ‘eu sou branco’ ou ‘eu sou feliz’. Refiro-me a dois modos fundamentais de existência, a duas diferentes espécies de orientação para com o eu e o mundo, a duas diferentes espécies de estrutura de caráter cujas respectivas predominâncias determinam a totalidade do pensar, sentir e agir de uma pessoa”. (Ser e ter, 1987, p. 43).

O universo humano pode se organizar, ou não, por intermédio dessas duas orientações, favorecendo ao ser que muitas vezes gasta o que não te, a não sucumbir-se aos mandos e desmandos da economia de mercado. Seria muito pertinente que todos os cidadãos e cidadãs pudessem repensar as suas respectivas listas de consumo a fim de consumirem, tão somente, aquilo que é vital para a dinâmica existencial. A pergunta basilar que pode e deve nos acompanhar é: “Preciso, de fato, disto que estou comprando”? Ora, comprar com certa razoabilidade é fundamental. Embora as empresas estejam agregando valores aos seus produtos, não se pode sucumbir às emoções ou mesmo à ideia de que aquilo adquirido impulsivamente vai proporcionar a felicidade.

Em geral, as pessoas possuem um lugar para morar, mas querem um lugar maior e melhor; possuem um carro bom, mas querem um carro zero km; podem viajar para uma excelente praia, mas querem ir para Cancun; o guarda-roupa se encontra cheio de roupas e sapatos, muitos deles sem uso, mas querem comprar mais e mais, consumindo todos os espaços.

O certo é que em qualquer uma dessas circunstâncias e situações, o desejo realizado não sucumbirá, pois abrirá portas para outro desejo. É um eixo sem fim. Uma coisa é certa: pessoas compram para se sentirem melhor, mas o que garante o bem-estar não é a aquisição disso ou daquilo, mas o encontro com aquele estado de espírito compatível com o equilíbrio da vida, especialmente o que favorece o bom entendimento com pessoas próximas ou distantes.

Ao final das contas, o que vale mesmo é o consumo de coisas e objetos que nos sejam realmente importantes, dentro dos respectivos orçamentos. Planejar o que se precisa é fundamental. Uma dica pertinente é focar no que se quer e precisa, cotejar o produto por algum tempo até que haja a possibilidade da aquisição definitiva ou não.

Assim, vale à pena se ornar do básico do básico para sobreviver e se expressar socialmente. Acumular coisas não traz sentido algum, porque, em geral, sempre usamos as mesmas coisas no habitual. Agora, de boa, tenha as suas roupas bem legais, mas nada além daquilo que é necessário.

No fundo, como diria Milton Santos: “Consumismo e competitividade levam ao emagrecimento moral e intelectual da pessoa, à redução da personalidade e da visão do mundo, convidando, também, a esquecer a oposição fundamental entre a figura do consumidor e a figura do cidadão”. Optemos, conscientemente, pela nossa cidadania.

 

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