terça-feira, 11 de julho de 2023

DIA 29 - Pela reinvenção das inconsequências

 


Eu acho que todos nós deveríamos nos embriagar continuamente na tarefa de reinventar a vida em suas inconsequências. É preciso despetalar as flores lindas que cerceiam o pântano para que algo novo aconteça. É muito estranho pensar no fato de que tudo tem que ser como sempre foi ou ainda é. Eu tenho uma paixão pelo inusitado e pelas coisas que acontecem numa mesa de bar, onde se comem bolinhos de bacalhau. Ah! Tá! Tudo bem! Os bolinhos têm mais batatas do que bacalhau, mas as geladas estavam nevadas, tipo “perninhas de pedreiro”, como se diz popularmente.

Quando vivo estas experiências, me localizo novamente naquela única ideia fixa quanto a ser continuamente surpreendido, tendo os meus olhos encantados diante do novo. Talvez isso se deva aos meus sofrimentos poéticos, os mesmos que brotam no cotidiano situacional dos meus espaços infinitos. Por isso, exponho-me em meus risos e danças em gestos espontâneos para ser o que realmente quero ser.

Será que sempre aceitamos o amor que achamos merecer? Pergunta boba quando o assunto mesmo é fazer o que precisa ser feito! Há abraços e beijos, e beijos e carícias que falam mais do que mil palavras. Chego a essa constatação com certa propriedade,  por acreditar piamente que tal tarefa tem a ver com aquilo que nos torna mais humanos, mais gente. Não somos mônadas estruturais ou estátuas condenadas à eternidade das praças históricas que temos a oportunidade de visitar nos grandes centros turísticos.
Mais do que isso, somos seres dotados de experiências e de movimentos que buscam mais experiências e mais movimentos num contínuo deslizar na flora do rio que uma hora chegará ao mar. Somos destinados a nos ressignificarmos continuamente na arte de atravessarmos o túnel sentindo a liberdade de ser, simplesmente ser...
Não posso mentir! Tenho orgulho da minha redenção de vida. Saí do caminho para me arranhar nas trilhas fechadas de uma mata selvagem. Gastei grande parte do meu tempo e da dinâmica do meu ser em uma esfera de atividades da qual eu gostava e me animava, mas que, depois de vinte minutos, deixou de fazer sentido para mim. Foram vinte longos minutos. Depois, resolvi abraçar outra perspectiva insólita e sem sentido para, depois de vinte minutos, montar uma rede à beira de um precipício com a finalidade de me balançar na amplitude da psicologia. Com isso, dei à minha vida outro sentido, um novo sentido com sabor de satisfação.
Eu acho que a vida realmente precisa de aspectos totalmente novos que alimentem a dinâmica da própria existência, lançando o ser para o avanço e o alcance de novos horizontes.

Trago para este momento reflexivo uma perspectiva presente na obra do filósofo alemão G. W. F. Hegel que afirmou uma dimensão muito interessante ao estabelecer, mediante linhas específicas da dialética aristotélica, filósofo grego, a ideia de uma dialética marcada por três estruturas: a tese, a antítese e a síntese. Não se pode relevar o brilhante argumento do filósofo alemão ao pensar as estruturas do pensamento pela lógica do idealismo, considerando a fórmula: “o real é o racional e o racional é o real”. E nessa espiral sem fim, ou quase sem fim – tem a questão do Estado nessa parada –, que Hegel provoca a sempre viva relação entre sujeito e objeto num percurso que almeja o diálogo contínuo e aberto. Com base na dialética de Hegel, o filósofo francês Paul Ricoeur elabora a sua dialética aberta e sem fechamentos, ampliando o debate da interpretação, apontando para a sua hermenêutica fenomenológica.  Assim, de braços dados com o método dialético apresentado por Hegel e amplificado por Ricoeur, afirmo categoricamente a minha vontade pela reinvenção da invenção da vida e pela redenção da alegria no cotidiano. Eu realmente não consigo conceber a vida sem a alegria, pois para mim a predisposição à alegria é o elemento central e situacional do ser humano perante a vida que, em suma, é muito curta como flash: uma faísca no meio de incêndio, como bem nos disse Heráclito. A vida não pode ser vivida de qualquer maneira, mas de formas aprofundadas e intensas.

Uma pergunta deve permear o pensamento de todo aquele que quer reinventar a vida: O que realmente posso fazer para que se tenha mais prazer, mais satisfação e mais alegria na existência? Tal pergunta vai requerer de cada ser um debruçar-se sobre a ideia presente no pensamento do psicanalista Roberto Freire, pai da Somaterapia, que nos convoca a realmente vivermos a vida mediante o nosso mais intenso pulso pelo tesão, pois é o tesão que mobiliza o ser humano para fazer aquilo que modifica a rotina e a automação. O tesão é a vacina. Por isso a máxima citada recorrentemente por Roberto Freire: “Sem tesão, não há solução”. Eu já perdi a conta de quantas vezes li o livro deste autor, pois ele alimenta a minha alma e me convoca a reinventar a vida que tenho, vivendo cada momento como sendo o melhor momento. Meu corpo tem fome de afetos e desejos que se debruçam nas janelas sensíveis de minha poesia, fazendo com que a todo instante eu afirme o fato de que a vida vale a pena ser vivida.

Portanto, o desafio contínuo é pela reinvenção da vida em suas inconsequências. As flores se reinventam, mesmo quando despedaçadas e tudo vira movimento, dança, risos e estranheza.


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