sexta-feira, 17 de abril de 2020

Simplesmente o amor (Décimo quinto texto)

       
“Tão bom morrer de amor! E continuar vivendo...”
Mário Quintana
        
         Vivo o amor! Sofro o amor! Morro de amor! Ah! O amor, vero amigo e carcereiro algoz! O grande gerador das maiores alegrias e das mais agonizantes tristezas humanas. Cantado e poetizado em diversas línguas e de múltiplas formas. Das emoções humanas, talvez a mais vital. Força maravilhosa que me martiriza, deixando-me inquieto com a vida. O cantor Renato Russo, citando Camões, expressou que “o amor é fogo que arde sem se ver. É ferida que dói e não se sente. É um contentamento descontente”. É um paradoxo sem limites paradoxais.
         Eu, de minha parte, não consigo viver a minha lida sem expressar as dimensões mais profundas do que realmente penso ser o amor. Não consigo amar pela metade ou de uma única maneira. Intento, o tempo todo, amar e amar muito, sem pestanejar. Sinto-me plenamente aberto para o amor e para amar. Louco, com todo o horizonte aberto diante dos meus sentidos, lanço-me ao distinto espaço vazio para amar quem quer que me apareça, como me for possível. De amor em amor, vou sobrevivendo, tentando me resgatar nesse mar de ondas espumantes e calmarias.
         Amor não é substantivo, mas verbo. Precisa ser construído na dinâmica relacional entre gente que se quer bem. Não há porquês e não há respostas. O amor é a conjugação dos mais vivos sentimentos que passeiam no corpo humano, mediante enzimas e substâncias que compõem a sua química.
         Entretanto, eu preciso confessar que, para além da felicidade e do gozo, o amor me deixa triste, fragiliza-me a alma e joga-me na lama. Mas o amor não é uma coisa boa? Não duvido disso! Todavia, é coisa boa que detona os sentimentos dos que se envolvem numa paixão, seja ela qual for. Poetizo num Amor que Insiste:
O corpo é vivamente cremado...
A vida depressa passou!
Valeu a pena viver?
Foi vivo e intenso o amor?

As perguntas chegam tarde.
As respostas nunca virão!
Resta a lágrima no rosto vivido,
E o nada dos passos no chão.

Quando tudo se perde na mente,
Resta a flor que enfrenta o inverno
E o gosto insano da dor.

A alma encontra remanso
Nas letras sagradas do verso
Que insiste querer o amor.

         A insistência pelo amor é fluxo entre as gentes. De um lado, há quem ame; do outro, a incerteza e a ambiguidade, pois o que garante que uma pessoa, de fato, ame a outra?
         Sabe o que vejo? Muitos dramalhões teatrais! Gente que diz que ama, mas não ama. Gente que finge amar e assim vai levando a vida. Gente que nunca soube o que de fato é amar. Faces ocultas da melancolia.
         Por outro lado, junto e misturado com as pessoas, não tenho como controlar o grito do amor na alma. Ele vem e ele vai, tal como a lua em suas fases. Não é fácil controlar a composição química que faz a gente acordar de madrugada e se perder em pensamentos desconexos e insanos. É preciso se manter Longe das Paixões:
Nada mais há de você em mim.
O tempo passou, o tempo voou e eu me libertei.
Não mais estou à beira do caminho.
As flores até perderam o encanto e as nuvens encobriram o sol, mas eu não me importo.
É bom que assim seja. Num momento a gente se enche de amor,
No outro a gente curte o que é dor... O medo se foi...
Paixão é bom porque chega e vai, quase nunca fica.
Eu volto a sorrir, com o corpo isento, sem agonia.
Todavia, tal qual onda do mar, insistirá, voltará... Talvez...
Tudo suporto, pois eu nada controlo.
Sigo cantando a melodia triste que dá alegria.
Beleza profunda que anima minh’alma num instante silente.
O fogo abaixou e as cinzas me deram o presente.
Ele é tudo o que tenho, pois o passado passou e o futuro é incerto.
Abraço a noite que cai. A lua minguante será minha companheira.
E no sombrio volume da madrugada, ando sem eira, sem beira, na rota da ponte que vai do nada ao vazio, pelo simples fato de ir.
Assento-me à beira do rio. Ele vaga calmamente escondendo os redemoinhos do profundo.
Um graveto flutua. Metáfora de mim sendo levado para qualquer lugar,
Longe das paixões...

         De fato, as paixões que evocam o amor provocam dores, as mais diversas e intensas. O pior é saber que não existe uma receita pronta para desfazer os sentimentos ambíguos, desviantes e inimagináveis que se instalam num lugar imaginário chamado coração.
         Além das dores, a paixão do amor sugere fantasias desassossegadas. O pensamento, sob o domínio dessa desordem em evidência, é uma fonte inesgotável de imaginações, na sua grande maioria, pervertidas, que às vezes se plasmam em sonhos. Ainda bem que não existe nenhum instrumento humano para registrar as imagens que nos visitam nos pensamentos e nos sonhos. Mas o que nos impede de realizar nossas imaginações mais pervertidas? Os filósofos me diriam que é a moral. Mas, moral e paixão não combinam. Paixão, pra ser amor, precisa ser imoral. Do contrário, é mera burocracia.
         Desburocratizando o amor no cotidiano, quero vivê-lo como uma grande aventura, formada essencialmente, de idas e vindas, encontros e desencontros. Anseio viver as paixões ao sabor de cada dia, enfrentando os dilemas e os problemas comuns que me fazem um humano ser de contradições. Nesses deslocamentos corriqueiros o amor me lança ao universo tresloucado do sexo.
         Para o equilíbrio de uma vida marcada pelo amor, o sexo, ou a boa resolução deste, é condição necessária para a homeostase emocional.
         Sei que muitas pessoas têm dificuldades pra pensar ou falar sobre o sexo. Sei de gente que só faz o sexo habitual, quem sabe, para manter a relação regulada. Sei de gente que não faz mais sexo. Sei de gente que faz sexo escondido. Sei de gente que acha o sexo sujo. Sei de gente que gosta de fazer sexo, principalmente quando tem liga e pele. Sexo bom não tem pudores. Pode e não pode ficam para escanteio. O combinado e as besteiras entre as partes é o que vale. Sexo tem que ser sujo, instintivo, lambuzado e, surpreendentemente, prazeroso. Obviamente, o prazer é efêmero, passageiro mesmo. Chega e vai. Vai e chega. Que beleza! Já basta. Acontece de forma inusitada e não precisa de validade. É preciso ser mais hedonista e aproveitar os prazeres que o corpo pode oferecer. Acredito que o prazer está presente nas mínimas oportunidades do cotidiano e é inusitado. Ele tem que ser descoberto das melhores maneiras possíveis.
         Se o que desejamos ao outro é o bem-estar real em todos os níveis, então o amor, o sexo, o prazer e a paixão que se manifestam entre as gentes não podem ser ofuscados por parcas percepções. Nos caminhos e descaminhos dos romances, alegrias e tristezas, contentamentos e sofrimentos sempre darão sentido ao que não tem sentido algum. Que nos sobrevenha uma descarga libidinosa. Talvez, por esse motivo intuitivo, Niezstche tenha feito questão de frisar: “Há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura”.

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